De acordo com informações do TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, o Ministério Público estadual, por meio do Gaeco, já vinha investigando a atuação criminosa de pessoas ligadas direta ou indiretamente a uma secretaria municipal da Capital, com a utilização de convênios com duas entidades: OMEP e Seleta.
Como desdobramento de investigação já em andamento, o Gaeco deflagou na manhã desta terça-feira (13) a Operação Urutau, onde foram cumpridos mandados de busca e apreensão, prisões temporárias e conduções coercitivas. A operação foi autorizada pelo juiz Mário Esbalqueiro Jr., que atuou na 1ª Vara de Execução Penal de Campo Grande até sexta-feira (9).
Importante esclarecer que a Vara de Execução Penal, de acordo com o Provimento 162/08 do TJMS, que trata da atuação do Grupo Especial de Combate Organizado do Judiciário de MS, é competente para apreciar pedidos de delegacias especializadas e do Ministério Público, quando os fatos apurados tiverem correlação com crime organizado.
O processo até então tramitava em segredo de justiça, por isso, os nomes das 10 pessoas físicas, além de sete pessoas jurídicas, sendo uma delas com diversos CNPJ's, objeto desta fase do procedimento investigativo não podem ser divulgados.
Esclareça-se que tramita no juízo também pedidos de quebra de sigilo telefônico, escuta autorizada e ação controlada. Consta do processo que a quebra de sigilo bancário e fiscal trouxeram informações que reforçam a movimentação milionária sob apuração, com fortíssimos indícios de crimes reiterados.
Segundo o MPE, recibos de prestação de serviços nos CEINF's em valores elevados não retratavam serviços efetivamente prestados. Uma das entidades faria uso de notas fiscais "frias" de serviços variados e tal comportamento para desviar valores ocorreria desde outras administrações municipais. A outra entidade reforçava a conduta duradoura e orquestrada de um grupo criminoso.
Conta dos autos que desde 2011 o Ministério Público vem cobrando a efetivação de medidas para enxugar as contratações da SELETA, em respeito ao disposto no art. 37, I e II da Constituição Federal, haja vista que o acesso a cargos públicos, em regra, deve observar a impessoalidade, moralidade, legalidade, cujo acesso previsto deveria ser pela via do concurso público.
Destaque-se a resistência por anos para resolver a questão por parte do Município e que a SELETA manteria milhares de contratados, a partir de recursos percebidos em convênio firmado com a secretaria municipal de Assistência Social. Descobriu-se nas investigações que muitos servidores contratados não prestam serviços em atividades ligadas ao convênio e outros vários sequer trabalham para a SELETA, tratando-se de funcionários "Fantasmas".
As apurações mostram também que alguns investigados possuem histórico de viagens internacionais e padrão de vida incompatível com a remuneração que recebem. Dados levantados pelo GAECO apontam a contratação cruzada para beneficiar a diretoria da SELETA e da OMEP. Relatório da Prefeitura da Campo Grande em 2013 mostra os pagamentos "cruzados" para burlar a previsão de trabalho voluntário na direção das entidades.
Relatório de inteligência financeira, elaborado pelo Conselho de Controle de Atividade Financeira (COAF), mostra repetidas solicitações de vultuosas quantidades de valores em espécie, contrariando a conduta esperada de uma ONG, com publicidade dos pagamentos por cheques ou transferências.
Além disso, os informes transmitidos pelo COAF confirmam denúncias recebidas pelo MP, de que SELETA e OMEP são utilizadas para desvios de dinheiro público, com a contratação fictícia de empresas e pessoas, o que justificaria as altas cifras levantadas em moeda corrente para “não deixar rastro”. Apontou-se que entre 2011 e 2015 a Seleta procedeu vultuosos saques de dinheiro para pagamento de pessoal e fornecedores, que chegariam ao montante de R$ 26,5 milhões.
O COAF destacou que repetidamente eram feitos saques vultuosos em espécie, indicando assim a possibilidade de desvio de valores. Soma-se a tantas práticas de indícios criminosos, a confirmação de contratações irregulares averiguada em processo cível, na 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos da Capital, no qual o juiz determinou um cronograma para demissões e rescisões de contratos, depois de verificada a contratação de mais de quatro mil pessoas, com destinações várias, sem atender a finalidade da ONG.
Ademais, consta do processo que boa parte desta quantidade de mão de obra nem a SELETA, nem a OMEP e nem o Município sabem identificar o efetivo local de trabalho destas pessoas. Em 2013, relatório da comissão de análise e supervisão de convênios apontou a cedência de funcionários contratados pela SELETA para vereador, contratação de dirigente da OMEP, além de vários funcionários “fantasmas” ou que há muito tempo não apareciam para trabalhar.
E mais: no curso das investigações criminais, concomitante com o processo na Vara de Direitos Difusos, descobriu-se que as práticas abominadas persistem. Percebeu-se a replicação de atos de desmandos, corrupção e malversação do dinheiro público. Duas das pessoas investigadas têm relação de parentesco com integrante da Câmara Municipal e eram beneficiadas com os desvios do dinheiro público, mesmo sendo empresárias.
Outras relações de parentescos foram descobertas pelo Gaeco e, em todos os casos, os fantasmas eram recebiam dinheiro público indevidamente. Nos áudios, anexados ao processo, foram detectados acordos para combinar depoimentos, alinhar versões a serem apresentadas. Em conversa monitorada, com autorização da justiça, chegou-se a confirmar que a quantidade de pessoal saiu de controle em razão das contratações com fins eleitoreiros, que o repasse não seria suficiente para pagar a quantidade de pessoal.
Além dos dados do COAF, a não localização de pessoal em qualquer local de trabalho, verificou-se adulteração de ponto, informações falsas e desvio de dinheiro público, tudo em grandes proporções. Uma creche serviria para "esquentar" o desvio de valores. Escutas telefônicas autorizadas mostraram contato intenso entre os membros da diretoria da SELETA, da OMEP, Creche e algumas empresas supostamente prestadoras de serviços, mas ligadas aos membros do esquema.
Outra medida postulada pelo MP foi a apreensão e análise dos aparelhos de telefonia celular dos investigados que tenham relação com qualquer espécie de atividade criminosa, pois em diversas situações o celular é utilizado como instrumento para prática de crimes, devendo ser apreendido e submetido ao exame pericial.
Assim, o juiz deferiu pedido de busca e apreensão na residência e locais de trabalho de G.M.S., A.C.P.S., E.P.S., W.P.R., K.R.P., E.T.P.B., M.A.S. e R.M.P. O mesmo trabalho foi autorizado para o gabinete da vereadora Magali Picarelli, nas dependências da SELETA e da OMEP, de uma creche, de uma empresa, de um instituto de formação, de uma empresa de contabilidade.
Foi deferida também a busca, apreensão e análise dos celulares dos investigados, ou portados por eles, com a devida identificação de IMEIs e das mensagens trocadas, por todos os tipos de aplicativos, em especial pelo denominado “whatsapp”, que tenham relação com qualquer espécie de atividade criminosa, com oportuna devolução dos telefones.
Três dos investigados tiveram decretada a prisão temporária (A.C.P.S., K.R.P. e M.A.S.) e os mandados de condução coercitiva para prestar depoimento na sede do Gaeco foram para G.M.S., E.P.S., W.P.R., E.T.B.P., A.A.S., R.M.P. e M.P.
Câmara Municipal
O gabinete da vereadora Magali Picarelli (PSDB)foi um dos alvos de busca e apreensão na manhã desta terça-feira (12) durante a operação Urutau. Ao sair do gabinete ela estava acompanhada do advogado Carlos Marques que não falou com a imprensa, saindo rapidamente. A informação inicial é que estaria sendo cumprido mandado de condução coercitiva contra a vereadora, o que não foi confirmado. Servidores do Gaeco passaram aproximadamente duas horas dentro do gabinete da vereadora.
Nesta tarde o advogado Carlos Marques, responsável pela defesa da vereadora enviou nota de esclarecimento a imprensa onde diz que denúncia de que as duas funcionárias seriam "fantasmas" não é verdadeira. "As funcionárias realmente foram cedidas ao gabinete, a pedido da Vereadora, e lá, efetivamente, trabalharam, até que foram devolvidas à entidade cedente, a pedido da mesma”, disse o advogado.